Conversar com Deus e consigo mesmo, e praticar Hatha Yoga
20/08/2017 14:40
Na minha infância, cresci em um ambiente relativamente espiritualizado, mas sem muita ligação com formalidades ou maneirismos desta ou daquela tradição religiosa. Por parte da mãe, tive um pouco de influência protestante e espírita (só mesmo no Brasil...). Por parte do pai, avó e também da escola onde estudei, tive uma influência mais católica. Nada muito diferente do que várias crianças também experimentam em nosso país.
Apesar de meus pais não serem pessoas religiosas praticantes, tecnicamente falando, eles sempre tiveram a preocupação de passar para mim e meus irmãos a importância de Deus em nossas vidas. Lembro-me de ir à igreja, de ir ao centro espírita, mas lembro-me principalmente das orações que fazíamos à noite antes de dormir. Assim aprendi a conversar com Deus...
Uma das características mais marcantes da maioria dos povos do Oriente e das tradições tribais é o fato da vida espiritual estar integrada à cultura, ao dia-a-dia das pessoas. O valor disso num nível mais profundo de consciência é relativo, mas não há dúvida que nós podemos aprender com esses irmãos a desenvolver uma relação mais próxima com o Sagrado em nossas vidas. Do momento que sentirmos, autenticamente, que o Sagrado está em tudo, estaremos comungando com Deus.
Lembro-me que, certa vez, viajando pelo sul da Índia, visitei um pequeno templo dedicado a Hanuman. O templo estava vazio e decidi aproveitar aquele auspicioso silêncio e meditar. Foi quando um senhor de idade chegou e, se ajoelhando e em lágrimas, começou a conversar com Deus. Percebi que aquela não era uma conversa simples, mas um verdadeiro desabafo pedindo misericórdia e bençãos para um momento de provação profunda. Depois de um bom tempo, ainda sem perceber minha presença, o senhor foi embora mais calmo e recomposto. E ali fiquei, quieto, emocionado, lembrando de tantos momentos semelhantes àquele na minha própria vida.
Oração é conversar com Deus, é comungar com "Ele". Neste sentido, o objetivo maior da nossa prática de yoga é desenvolver a habilidade de orar, de rezar, de estar integrado a algo maior do que pensamos e achamos que somos. Tão importante é ter a coragem, a humildade e a simplicidade de iniciar uma conversa com "Aquele" (ou, se preferir, "Aquilo"), que transcende nossa realidade egocêntrica, confusa, iludida. Tão importante é se humildar, pedir a benção, o perdão, agradecer...
Quando começamos a nos relacionar com a vida além da sua aparência superficial, quando entendemos que nosso momento humano faz parte de uma dimensão mais ampla, quando compreendemos espiritualidade como a arte de viver de forma mais consciente, responsável e equilibrada, estamos praticando yoga, estamos orando, estamos conversando e comungando com Deus.
Nossa realização pessoal é um reflexo da relação que desenvolvemos com "Ele". Em tudo.
Quando oramos e pedimos a benção, o perdão ou nos sentimos agradecidos, somos nós mesmos, nosso potencial essencial, a presença de Deus em nós, que se realiza. Muito além de crenças condicionadas, práticas vazias ou projeções iludidas, aqui temos uma possibilidade simples, acessível e sempre disponível.
Texto escrito para coluna "Simples Mente" - Prana Yoga Journal